terça-feira, 16 de julho de 2013

Tempo pra que?


Este final de semana de sol estive na praia, estou de férias e pela primeira vez em muito tempo consegui voltar para casa numa segunda-feira à tarde, o que tornou a noite de domingo um tanto quanto agradável, sem o pesar de saber que o dia seguinte é segunda-feira e começa tudo de novo.
 
É preciso gostar do trabalho para dedicar-se a ele por 20, 30, 40 ou 80 horas semanais. Não vou discutir relações de trabalho e nem se são justas ou não, pois essa discussão não tem fim. O que eu penso é que as regras da vida trabalho-casa-família tornam a vida muito chata pela falta de tempo que impomos a nós mesmos.
 
Ponto 1: para viver é preciso ter o mínimo de coisas materiais (pelo menos para mim, creio ser impossível ser totalmente desapegada, mas acho que ainda vou encontrar muitos exemplos por aí). Para isso, é preciso ter dinheiro. Para isso, é preciso trabalhar. Para isso, é preciso tempo.
 
Ponto 2: para viver é preciso se estabelecer em algum lugar, seja numa casa, num apartamento, numa barraca, numa caverna, num hotel, numa cabana. Para isso, é preciso cuidar do lugar. Para isso, é preciso tempo.
 
Ponto 3: para a maioria das pessoas, família é tudo. É dela que viemos, é com ela que convivemos boa parte da vida, é ela quem vai se despedir de mim quando morrer (assim creio eu). Para isso, é preciso cultivá-la. Para isso, é preciso tempo e dedicação. Muito amor. E muita paciência.
 
Tempo hoje virou artigo de luxo, tanto é que compramos coisas, contratamos pessoas e pensamos o tempo todo em como ter mais tempo. Talvez se usássemos este tempo de forma melhor, teríamos que pensar menos sobre como economizá-lo.
 
Não sobra tempo para as coisas importantes. Gastamos tempo demais no trânsito, comprando coisas que não precisamos, navegando por páginas que não nos acrescentam nada, na televisão assistindo a imbecilidades, na cozinha aquecendo pratos congelados enquanto tomamos banho – já que não temos tempo para cozinhar – e reclamando que falta tempo para por as coisas em dia. A casa não é cuidada, fica uma bagunça. A família fica em segundo plano, não temos mais tempo para amar e para ter paciência com os outros. E o trabalho fica atrasado, mas este não podemos deixar de lado, afinal é o ganha-pão. É com ele que pago as contas de celular, de internet, do supermercado, do shopping, da prestação do carro do ano, da viagem pra Disney, da manicure, da empregada, do restaurante, dos presentes dos filhos, da academia, dos cremes.
 
Se gastássemos menos dinheiro com inutilidades, trabalharíamos menos e teríamos mais tempo para cuidar, cultivar e amar. Sempre que fazemos algo que nos deixa bem, dizemos a nós mesmos que deveríamos fazer aquilo mais vezes, mas não temos tempo para isso. Tempo todo mundo tem, é só uma questão de escolha.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

O limiar da irritação: como os problemas alheios detonam o seu sábado de sol

Não sei se é o mal do século, mas tenho a impressão de que as pessoas andam valorizando demais os “problemas da vida”, ficando com humor deprimido, carentes e necessitadas de atenção, de qualquer um que estiver na fila do supermercado, no assento ao lado ou na sala de espera do consultório médico. Ou será a falta de paciência com este tipo de situação um problema meu? Ajudem-me a descobrir, por favor.

Situação 1: Irritação máxima

Sábado de manhã, você está saindo de casa e encontra a sua vizinha no corredor. Como qualquer pessoa minimamente educada, a cumprimenta:

- Bom dia.

- Bom dia. Tudo bem?

- Tudo bem, e você? (pura força de expressão)

- Ah, mais ou menos. Estou com uma dor de cabeça que não passa...
 

- Se você quiser eu posso ver se tenho algum analgésico aqui em casa.
- Ah, agradeço muito!

- Entra um pouquinho enquanto eu dou uma olhada.

Enquanto isso, ela se senta no seu sofá. Você volta com o comprimido e um copo d’água na mão, entrega para ela. Ela olha para o comprimido, olha para o copo d’água, e olha para você, sem tomá-lo.

- Sabe... acho que esse remédio não vai me ajudar. Estou cansada de tomar remédio atrás de remédio, e parece que nada melhora.

Você, já desconfiada da situação, senta-se ao lado dela e pergunta:
- Como assim? Alguma coisa errada?
Ela coloca o comprimido e o copo d’água, intactos, na mesinha ao lado dela, de madeira, e você torcendo para não manchar, mas com receio de retirá-lo dali e parecer mal educada. Pô, será que ela não sabe que o copo d’água mancha a madeira da mesa? Irritação estágio 1.

- Não sei bem o que é, mas não venho me sentindo bem há algum tempo, tenho dores de cabeça quase todos os dias. Já fui ao médico, já fiz exames, mas ele diz que não é nada, que eu preciso me alimentar melhor, dormir melhor, fazer exercícios... mas é tão difícil.

- Mas ele não te passou nada para tomar?

- Passou um remedinho que eu tomo antes de dormir, tenho um pouco de insônia, e me ajudou um pouco, mas não muito... Sabe, ando meio desanimada...
- Hum...
- Não sei se gosto da Vania, minha nora, acho que não é mulher para o Bentinho. Mas se ele gosta dela, fazer o que? O importante é a felicidade dos nossos filhos...

- Mas por que não gosta dela?

- Acho que ela não vai conseguir cuidar dele. Você acredita que ela mal sabe cozinhar? Ele disse que ela não passa nem as roupas dela... quem vai arrumar as roupas dele? Passar as camisas...
- Ele não pode fazer isso?

- Ah... não sei... tadinho, ele trabalha tanto, e você sabe, homem não consegue fazer essas coisas.
Claro, porque ninguém ensinou. Qualquer ser humano dotado de um cérebro e um pouco de coordenação motora é capaz de aprender a fazer qualquer tarefa doméstica. Cá para nós, eu e você sabemos que o medo da vizinha é que o filhinho mimado dela tenha que botar a mão na massa e desaprender todo o conforto que ela ensinou para ele. E a tal da Vania, não trabalha muito também? Talvez esteja na hora do Bentinho fazer um curso intensivo e aprender que o pano de chão sujo de cerveja derramada, xixi de cachorro e graxa não aparece milagrosamente limpo no varal no dia seguinte. Irritação estágio 2.

- Ah, mas os casais hoje em dia são assim, é normal dividirem as tarefas, porque empregada virou artigo de luxo.

- Ah, nem me fala... ruim com elas, pior sem elas. Eu A D O R O a Edilaine, mas sabe que tem horas que me irrita? Eu canso de explicar que o Milton só gosta de bife mal passado, mas ela sempre passa do ponto, e ele acaba reclamando comigo! Que eu tenho que ensinar direito essa menina a fazer o bife, que desse jeito ele não vai mais almoçar em casa, e que eu vou ter que começar a cozinhar no lugar dela para sair direito. Você acredita?

- Pois é... (irritação estágio 3).

- Fora que eu acho que ela está usando as minhas roupas.

- Como assim?

- Ano passado, me matriculei na academia ali na esquina, pois estava querendo emagrecer, e comprei um monte de roupas de ginástica, e eu acho que ela está usando escondido.
 

- Mas se você está usando, como ela pode estar usando também?
- É que depois de um tempo acabei desistindo da academia, então parei de usar as roupas. E como uso pouco, acho que ela está pegando, sabe? As vezes dou falta... e olha que paguei uma nota, que desaforo!

- Por que você não pergunta discretamente?

- Ah, você sabe como é esse pessoal! Se eu perguntar vai ficar ofendida, querer me processar, esse negócio de processo é sério, viu? Tenho várias amigas que já sofreram ameaça dos empregados! E eu estou achando que ela está colocando alguma coisa na comida, porque depois que eu falei com ela do bife do Milton, eu comecei a sentir uma coisa estranha na barriga, uma sensação esquisita...

- Uma dor?
- Não é bem dor, é uma sensação estranha, em tudo assim, ó – e ela passa a mão pelo abdômen inteiro, sem identificar exatamente onde é que incomoda.

- Ah, pode ser só impressão. O médico que você foi te examinou?

- Examinou, e disse que estava tudo bem, só deu uma gordurinha no fígado num dos exames.

- Gordura no fígado?

- De uns tempos para cá eu perdi um pouco o controle do meu peso, sabe? Estava muito ansiosa... aliás, eu sou ansiosa... exagerei um pouco na comida, mas só um pouquinho...

- Hum-hum.
- Eu até fiz os Vigilantes e emagreci um pouco, mas depois parei, e voltou tudo... depois comprei alguns livros, tentei aquela dieta de South Beach, mas também não deu certo. Eu tomo Herbalife, as vezes, é tão prático! Mas não sei, não consigo emagrecer... acho que meu metabolismo é muito lento.
- Mas e os exercícios?

- Ah, não me dei bem na academia, achei os professores muito despreparados.

- Ou foi a preguiça? Hehehe. – comentário sarcástico #1, irritação estágio 4.

- Ah, as vezes dá uma preguicinha de sair de casa, a gente tem tanta coisa para fazer – imagino o que tanto uma dona de casa, com empregada, com filhos que já nem moram mais com ela, pode ter para fazer – é uma correria, e quando vou ver o Milton já chegou do serviço e tenho que arrumar o jantar para ele.

- E por que você não vai de manhã cedo?

- É... pode ser... (Porque é preguiçosa! Irritação estágio 4,5)

- Eu costumo acordar e ir bem cedo, dá muita disposição para o dia.
- É que eu tenho o hábito de dormir tarde. Sempre fui assim, gosto de ficar assistindo um filminho à noite, quando vou ver já é de madrugada e ainda estou acordada. Daí acabo levantando um pouco mais tarde no dia seguinte.

- Será que não é por isso que você tem dificuldade para dormir? Ouvi dizer que assistir televisão à noite não deixa o cérebro descansar – comentário sarcástico #2, mas pelo visto não está surtindo efeito.

- Ah não, eu sempre fui assim, da noite, não deve ter a ver não – negação total! Ou “não quero melhorar para ter assunto para falar com as amigas, ou com as vizinhas”. Irritação estágio 5!!!

E nisso se foram 2 horas do seu sábado ensolarado, que você tinha planejado dar uma volta, comer alguma coisa e dar um pulo no cinema. Lamúrias, lamentações e “problemas” da sua vizinha que te alugou para conversar (ou reclamar) da empregada, da nora, dos legumes da feira, da barriga, da gordura no fígado, da insônia, do marido, do carro, da novela, da conta de telefone (lógico, ela deve ficar o dia inteiro pendurada falando nada com nada!), do porteiro, do PT, do cabelereiro, da farofada na praia que ela frequenta, do pet shop. Até que toca o seu telefone. Viva! Salvo pelo gongo, talvez um pouco tarde demais...

- Olha, desculpe, mas minha amiga está me esperando para ir ao cinema, eu vou ter que sair.

- Ah, claro, não tem problema – olha no relógio. Nossa, como o tempo voou! Daqui a pouco o Milton volta do tênis, tenho que preparar o jantar! Desculpe te alugar, viu? Hehehehe... mas A D O R E I conversar com você, passa lá em casa outro dia para tomarmos um café.

- Ah sim, pode deixar – nem sob a mira de uma arma alguém conseguiria dizer que também gostou de conversar com ela.

- Tchau, querida, até a próxima! E vai ser fácil a gente se encontrar, moramos tão pertinho!

- Hehehe – sorriso amarelo – pois é!
Você fecha a porta, agradecendo a Deus, Buda, Alá, Iemanjá, Exu, Satanás e todos os deuses, santos e entidades existentes por aquele tormento ter acabado antes de você soltar um grito bem forte e dar um soco na cara dela. E, antes de sair, tomou o comprimido que tinha ficado sobre a mesa de madeira, agora manchada.

Situação 2: BINGO!

Sábado de manhã, você está saindo de casa e encontra a sua vizinha no corredor. Como qualquer pessoa minimamente educada, a cumprimenta:

- Bom dia.
- Bom dia. Tudo bem?

- Tudo, e você? (pura força de expressão)

Chama o elevador.
- Ah, mais ou menos. Estou com uma dor de cabeça que não passa...

- Ah, então hoje é o seu dia de sorte! Tenho um analgésico aqui na bolsa - desvia o olhar para dentro da bolsa, finge que demora um pouco para encontrar até o elevador chegar, e quando vê que chegou, o retira da bolsa. Toma agora que daqui a pouco passa! Tchau, tchau!

Sem dar tempo de a vizinha agradecer a sua boa ação do dia, você vira as costas e entra no elevador rapidinho, só ouve do outro lado da porta um “Obrigada”, com um certo ar de desânimo, e desce até a garagem.

Moral da história: Para evitar dores de cabeça, carregue sempre um Doril com você.

terça-feira, 2 de julho de 2013

Feliz Ano Novo

Escrevi na passagem de 2011 para 2012, vale a reflexão.


AFINAL, O QUE É FELICIDADE?



Pergunta difícil! Dizem por aí que dinheiro não traz felicidade, que é impossível ser feliz sozinho... mas o que me faz feliz te faz feliz?


Parece que todo mundo tem obrigação de ser feliz, como se fosse um sinal vital. Parece uma coisa que se compra e que se consome, como se fosse tão fácil sentir algo tão complexo, e ao mesmo tempo tão simples. E como as pessoas ainda estão descobrindo o que é felicidade, continuam consumindo e comprando, sem mesmo saber o que é.


Um amigo querido deu um sábio exemplo de felicidade: é o que sentimos quando acabamos de chupar um picolé e o palito vem premiado! De fato, esses segundos entre acabar o picolé, procurar a mensagem escrita no palito, ler “vale um picolé” e contemplar esses segundos, isso é felicidade! Não colocamos um largo sorriso no rosto?


Outra amiga querida me disse: as melhores coisas do mundo não são coisas. Ter as coisas não nos faz feliz de verdade. Talvez por um instante, como se ter significasse conquistar algo, ser dono, ter domínio, mandar, fazer o que quiser e o que não quiser também, sensação de poder... que medo dessa sensação! Corrompe as pessoas e distorce os valores. A ilusão do poder ofusca a amizade, o respeito, envolve todos numa névoa escura e cinzenta de falsidade, soberba, falta de vergonha na cara... e de tristeza!


Prefiro não ter ou ser dona de nada, não ter poder sobre nada nem ninguém, e ter a consciência preenchida com tranquilidade, sentimentos puros e sinceros, poder falar o que penso (com polidez, é claro), não sentir ameaças e caminhar de cabeça erguida por aí, sentindo o calorzinho do sol e o vento no rosto ao invés de me esconder atrás de uma fortaleza e abdicar do prazer da liberdade. Às vezes, ter as coisas nos faz ter medo, receio, desconfiança e a sensação iminente de que o pior pode acontecer a qualquer hora. Melhor mesmo é não ter nada.


As melhores coisas do mundo são os momentos. Fazer um amigo logo no primeiro dia de aula. Receber o carinho de um animal de estimação. Ganhar uma caixa de lápis de cor e imaginar todos os desenhos que fará com eles. Receber o desenho que o seu filho fez com a caixa de lápis de cor no Dia das Mães. Abrir o envelope de fotos que acabaram de ser reveladas. Ver a satisfação no rosto das pessoas enquanto elas comem o prato que você preparou. Receber aquela notícia que você esperava há tempos. Ir à praia num dia ensolarado. Tirar aquela carta no jogo de baralho. Pegar um peixe na pescaria. Receber um abraço quando precisamos de conforto. Receber um pedido de desculpas sincero. Receber um elogio sincero. Ter a certeza de que seus amigos são companheiros verdadeiros. Chorar quando der vontade. Dançar loucamente aquela música que você adora. Completar uma maratona. Abrir aquele presente surpreendente. Ver seus convidados se divertindo na sua festa. Receber uma carta de amor do amor da sua vida, sem um saber do amor do outro. Fazer novos amigos e companheiros de vida. Pegar a primeira onda. Reunir-se com pessoas queridas. Ver o álbum de fotos antigas. Passar no vestibular. Andar de bicicleta sem rodinhas. Dar o primeiro beijo. Dar o primeiro beijo no amor da sua vida. Comer um prato de sopa quentinho que a sua mãe fez para te curar da gripe. Receber um cartão postal de um amigo que se lembrou de você durante a viagem. Sentar no sofá com os pés para cima por alguns minutos. Ver a planta que você plantou crescer. Tirar um cochilo na rede depois do almoço. Receber um cafuné. Cuidar de quem se gosta. Dormir abraçado. Apaixonar-se. Completar o álbum de figurinhas. Lembrar de velhas e boas histórias. Fazer o café da manhã na cama. Tomar banho de cachoeira. Perder a noção dos dias e das horas. Estourar a champagne e torcer para que momentos como esses continuem no ano que entra. FELIZ ANO NOVO!

O início


Seguindo o conselho de Thoreau, citado por Clarice, eis que sentei para escrever agora. Se o momento chegou, chega de esperar até o amanhã que nunca chega. Afinal, a vida é feita de agoras.